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Código de Processo Civil e Commercial do Estado do Ceará - Versão Artesanal

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A Constituição do Estado do Ceará de 1921 estabeleceu no art. 4º, “d”, de suas Disposições Transitórias que “a Assembléa Legislativa, nesta ou na próxima sessão ordinária, votará, na conformidade do disposto nesta Constituição, o Codigo de processo civil, commercial e criminal do Estado”. Diferentemente do que se tornou constante a partir da Constituição Federal de 1934, a Constituição Federal de 1891 atribuía ao Congresso Nacional competência processual apenas para a jurisdição federal, restando, então, aos Estados a competência para o processo civil, penal e comercial em geral. 

Naquela mesma sessão, o legislativo cearense, sob a presidência do Deputado Rubens Monte, cumpriu seu dever constitucional: votou e aprovou o texto que, sancionado pelo Presidente do Estado, Justiniano de Serpa, tornou-se a Lei nº 1.152, de 30 de dezembro de 1921, estatuindo, assim, o Código de Processo Civil e Comercial do Estado do Ceará. Alterações relevantes foram realizadas posteriormente pela Lei nº 2.420, de 16 de outubro de 1926, devidamente incorporadas. 

É esse histórico texto que é trazido de volta ao prelo nacional, permitindo que juristas e em especial os processualistas do século XXI possam buscar inspiração e conhecimento na pena do legislador cearense de um século atrás. E certamente há mais do que lições de história do direito a serem apreendidas do presente Código. 

Quanto ao contexto histórico que cercava sua edição, tinha-se que a Faculdade Livre de Direito, atual Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, funcionava desde 1903, sendo o principal centro de formação da elite intelectual cearense. Quem se dedicava às letras jurídicas no estado já tinha em Clóvis Beviláqua, cearense nascido em Viçosa e formado no Recife no Século XIX, fonte de inspiração e erudição, pois fora o idealizador do então recente Código Civil brasileiro de 1916 e deputado constituinte na primeira constituição do Ceará. 

Havia no movimento de codificação e na descentralização política federativa do período uma forte intenção de trazer o Brasil, ainda uma sociedade agrária e rural, para um cenário jurídico e institucional mais apropriado ao Século XX, em um mundo recém emergido da Grande Guerra. O código é editado, pois, sob inspirações nacionais e internacionais, mas voltado a uma região que sofria fortemente com as adversidades do clima, sem os meios de atenuação e combate atualmente existentes. A grande seca de 1915 (que em 1930 seria retratada por Rachel de Queiroz na obra prima nacional O Quinze), mais do que um relato literário era uma recente e amarga memória para os parlamentares envolvidos na elaboração desta legislação. 

Em 1926, ano da relevante modificação legislativa incorporada ao presente texto codificado, aconteceu a eleição de Washington Luis, último Presidente da Primeira República, justamente a mais compromissada com a descentralização federativa de que este código é produto direto. 

No mesmo ano, a Coluna Prestes marchava do Piauí em direção ao Ceará. Padre Cícero, que se elegeria Deputado Federal ainda em 1926, era o inconteste líder de Juazeiro do Norte, na região do Cariri, por onde o Ministério da Guerra previa a passagem da coluna revoltosa, vendo, no local, o campo próprio para barrar-lhe o percurso. 

Arregimentaram-se mil voluntários para uma batalha campal em solo cearense, todos devidamente abençoados por seu líder espiritual. Contudo, Floro Bartolomeu, correligionário de Cícero, não os julgou suficientes, decidindo arregimentar para o combate ao comunismo Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, convencido por carta escrita à máquina, mas firmada pelo Padre, sob a promessa de alto pagamento e a outorga do título de Capitão do Batalhão Patriótico. A coluna não apareceu, a batalha não ocorreu, mas Padre Cícero e Lampião tiveram seu único encontro naquele ano, tendo sido cumprida a promessa com a outorga do título de capitão ao Rei do Cangaço, conferido das mãos do único funcionário federal existente na cidade, um inspetor agrícola, que depois, ao ser indagado sobre seus poderes legais para o ato, diria que naquelas circunstâncias assinaria até a exoneração do Presidente da República, quanto mais a nomeação de Lampião. 

É desse passado cearense parte idílico, parte áspero que emergem os 1.420 artigos, além dos dois constantes nas disposições transitórias, divididos em quatro partes. 

A Parte I traz disposições preliminares e assuntos como citação, competência, proposição da ação e defesa, intervenção de terceiros, meios de provas entre outros próprios do que hoje se encontra na parte geral da atual lei processual. 

O processo comum é tratado na Parte II, com os procedimentos, ou mais precisamente, as “acções” ordinária, sumária e sumaríssima, seguindo aquilo que era comum entre os processualistas de então, com enumeração dos casos em que cada opção deve ser utilizada, inclusive considerando o valor da causa. 

A Parte III cuida das ações possessórias, revelando a clássica preocupação de se ter tutela própria e exclusiva a posse, seguido das ações próprias para tutelar a propriedade. Há ainda disposições sobre as antigas ações de desquite e de separação de dote, busca e apreensão, alimentos provisionais, inventário e partilha, entre outros, além dos chamados processos administrativos, que tratavam da dissolução e liquidação de sociedade e desapropriação. 

A quarta e última parte trata das execuções, com algumas diferenciações ainda hoje conhecidas, como a execução contra a Fazenda Pública, no caso contra Estado e Município, por quantia certa e por coisa certa ou incerta, incluindo disposições sobre penhora, avaliação, hasta pública, remissão e embargos do executado, com embaraços e preocupações que ainda afligem aqueles que buscam a satisfação de seu direito. São, portanto, ao menos cem anos de um modelo já melhorado, mas que deita profundas raízes e inspiração naquele passado remoto que já deveria ter sido superado. 

Ainda nessa última parte, há o trato dos recursos, que eram apelação, agravo, carta testemunhável, embargos e recurso extraordinário, com disciplinamento sobre prazos, com disposições similares às atuais como: “o prazo contra o terceiro prejudicado correrá da mesma data da intimação ás partes”. 

Curioso perceber que o hoje Tribunal de Justiça era o Superior Tribunal de Justiça, denominação dada pelo constituinte derivado decorrente. O agravo trazia a taxatividade das hipóteses de cabimento que se retomou em 2015 (ainda que da forma mitigada, consoante decisão do Superior Tribunal de Justiça de hoje), mas com um extenso rol de 55 incisos, referindo-se a despachos e decisões (que não recebiam o adjetivo de “interlocutórias”). Como o recurso extraordinário era direcionado ao Supremo Tribunal Federal, órgão federal, o código limitava-se a remeter à legislação processual federal seu disciplinamento, em uma dualidade de competência legislativa estranha para os dias atuais. 

Foram 18 anos de vigência deste código estadual, substituído pelo primeiro nacional de igual matéria. No entanto, muito do que constava no Código de Processo Civil de 1939 já podia ser verificado em seu antecedente cearense, demonstrando seus acertos em vários aspectos. 

Por fim, resta deixar o registro de congratulações e sinceros agradecimentos aos amigos Bruno Fuga e Antônio Pereira Gaio Júnior pela iniciativa de reeditar os códigos estaduais e me darem a grande honra de apresentar o do meu querido Estado do Ceará.


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Autores: Juraci Mourão Lopes Filho

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Este livro possui versão comum. Acesse: https://editorathoth.com.br/produto/codigo-de-processo-civil-e-commercial-do-estado-do-ceara--versao-artesanal/424


A Constituição do Estado do Ceará de 1921 estabeleceu no art. 4º, “d”, de suas Disposições Transitórias que “a Assembléa Legislativa, nesta ou na próxima sessão ordinária, votará, na conformidade do disposto nesta Constituição, o Codigo de processo civil, commercial e criminal do Estado”. Diferentemente do que se tornou constante a partir da Constituição Federal de 1934, a Constituição Federal de 1891 atribuía ao Congresso Nacional competência processual apenas para a jurisdição federal, restando, então, aos Estados a competência para o processo civil, penal e comercial em geral. 

Naquela mesma sessão, o legislativo cearense, sob a presidência do Deputado Rubens Monte, cumpriu seu dever constitucional: votou e aprovou o texto que, sancionado pelo Presidente do Estado, Justiniano de Serpa, tornou-se a Lei nº 1.152, de 30 de dezembro de 1921, estatuindo, assim, o Código de Processo Civil e Comercial do Estado do Ceará. Alterações relevantes foram realizadas posteriormente pela Lei nº 2.420, de 16 de outubro de 1926, devidamente incorporadas. 

É esse histórico texto que é trazido de volta ao prelo nacional, permitindo que juristas e em especial os processualistas do século XXI possam buscar inspiração e conhecimento na pena do legislador cearense de um século atrás. E certamente há mais do que lições de história do direito a serem apreendidas do presente Código. 

Quanto ao contexto histórico que cercava sua edição, tinha-se que a Faculdade Livre de Direito, atual Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, funcionava desde 1903, sendo o principal centro de formação da elite intelectual cearense. Quem se dedicava às letras jurídicas no estado já tinha em Clóvis Beviláqua, cearense nascido em Viçosa e formado no Recife no Século XIX, fonte de inspiração e erudição, pois fora o idealizador do então recente Código Civil brasileiro de 1916 e deputado constituinte na primeira constituição do Ceará. 

Havia no movimento de codificação e na descentralização política federativa do período uma forte intenção de trazer o Brasil, ainda uma sociedade agrária e rural, para um cenário jurídico e institucional mais apropriado ao Século XX, em um mundo recém emergido da Grande Guerra. O código é editado, pois, sob inspirações nacionais e internacionais, mas voltado a uma região que sofria fortemente com as adversidades do clima, sem os meios de atenuação e combate atualmente existentes. A grande seca de 1915 (que em 1930 seria retratada por Rachel de Queiroz na obra prima nacional O Quinze), mais do que um relato literário era uma recente e amarga memória para os parlamentares envolvidos na elaboração desta legislação. 

Em 1926, ano da relevante modificação legislativa incorporada ao presente texto codificado, aconteceu a eleição de Washington Luis, último Presidente da Primeira República, justamente a mais compromissada com a descentralização federativa de que este código é produto direto. 

No mesmo ano, a Coluna Prestes marchava do Piauí em direção ao Ceará. Padre Cícero, que se elegeria Deputado Federal ainda em 1926, era o inconteste líder de Juazeiro do Norte, na região do Cariri, por onde o Ministério da Guerra previa a passagem da coluna revoltosa, vendo, no local, o campo próprio para barrar-lhe o percurso. 

Arregimentaram-se mil voluntários para uma batalha campal em solo cearense, todos devidamente abençoados por seu líder espiritual. Contudo, Floro Bartolomeu, correligionário de Cícero, não os julgou suficientes, decidindo arregimentar para o combate ao comunismo Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, convencido por carta escrita à máquina, mas firmada pelo Padre, sob a promessa de alto pagamento e a outorga do título de Capitão do Batalhão Patriótico. A coluna não apareceu, a batalha não ocorreu, mas Padre Cícero e Lampião tiveram seu único encontro naquele ano, tendo sido cumprida a promessa com a outorga do título de capitão ao Rei do Cangaço, conferido das mãos do único funcionário federal existente na cidade, um inspetor agrícola, que depois, ao ser indagado sobre seus poderes legais para o ato, diria que naquelas circunstâncias assinaria até a exoneração do Presidente da República, quanto mais a nomeação de Lampião. 

É desse passado cearense parte idílico, parte áspero que emergem os 1.420 artigos, além dos dois constantes nas disposições transitórias, divididos em quatro partes. 

A Parte I traz disposições preliminares e assuntos como citação, competência, proposição da ação e defesa, intervenção de terceiros, meios de provas entre outros próprios do que hoje se encontra na parte geral da atual lei processual. 

O processo comum é tratado na Parte II, com os procedimentos, ou mais precisamente, as “acções” ordinária, sumária e sumaríssima, seguindo aquilo que era comum entre os processualistas de então, com enumeração dos casos em que cada opção deve ser utilizada, inclusive considerando o valor da causa. 

A Parte III cuida das ações possessórias, revelando a clássica preocupação de se ter tutela própria e exclusiva a posse, seguido das ações próprias para tutelar a propriedade. Há ainda disposições sobre as antigas ações de desquite e de separação de dote, busca e apreensão, alimentos provisionais, inventário e partilha, entre outros, além dos chamados processos administrativos, que tratavam da dissolução e liquidação de sociedade e desapropriação. 

A quarta e última parte trata das execuções, com algumas diferenciações ainda hoje conhecidas, como a execução contra a Fazenda Pública, no caso contra Estado e Município, por quantia certa e por coisa certa ou incerta, incluindo disposições sobre penhora, avaliação, hasta pública, remissão e embargos do executado, com embaraços e preocupações que ainda afligem aqueles que buscam a satisfação de seu direito. São, portanto, ao menos cem anos de um modelo já melhorado, mas que deita profundas raízes e inspiração naquele passado remoto que já deveria ter sido superado. 

Ainda nessa última parte, há o trato dos recursos, que eram apelação, agravo, carta testemunhável, embargos e recurso extraordinário, com disciplinamento sobre prazos, com disposições similares às atuais como: “o prazo contra o terceiro prejudicado correrá da mesma data da intimação ás partes”. 

Curioso perceber que o hoje Tribunal de Justiça era o Superior Tribunal de Justiça, denominação dada pelo constituinte derivado decorrente. O agravo trazia a taxatividade das hipóteses de cabimento que se retomou em 2015 (ainda que da forma mitigada, consoante decisão do Superior Tribunal de Justiça de hoje), mas com um extenso rol de 55 incisos, referindo-se a despachos e decisões (que não recebiam o adjetivo de “interlocutórias”). Como o recurso extraordinário era direcionado ao Supremo Tribunal Federal, órgão federal, o código limitava-se a remeter à legislação processual federal seu disciplinamento, em uma dualidade de competência legislativa estranha para os dias atuais. 

Foram 18 anos de vigência deste código estadual, substituído pelo primeiro nacional de igual matéria. No entanto, muito do que constava no Código de Processo Civil de 1939 já podia ser verificado em seu antecedente cearense, demonstrando seus acertos em vários aspectos. 

Por fim, resta deixar o registro de congratulações e sinceros agradecimentos aos amigos Bruno Fuga e Antônio Pereira Gaio Júnior pela iniciativa de reeditar os códigos estaduais e me darem a grande honra de apresentar o do meu querido Estado do Ceará.


ISBN 978-65-5959-142-8
Dimensões 23 x 15.5 x 3
Tipo do Livro Impresso
Páginas 282
Edição 1
Idioma Português
Editora Editora Thoth
Publicação Novembro/2021
  1. Juraci Mourão Lopes Filho
    Doutor e Mestre em Direito. Pós-graduado lato sensu em Direito Processual Civil. Coordenador do Mestrado Acadêmico em Direito do Centro Universitário Christus - UNICHRISTUS. Procurador do Município de Fortaleza. Advogado.

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